25 fevereiro 2010

Tribunal

A tarde, como a noite, cai.
Não há diferença, pois há semelhança suficiente entre coisas diferentes,
Pelo menos para mim.
Como meu pensamento e o pensamento em si.
Diferem-se só pela simplicidade do meu julgamento.
Julgamento traiçoeiro.
Julgamento próprio, que vê em outro, seus próprios réus.
Acuso-me não sem refletir, mas pelo menos sem notar.
Coitados seríamos nós se me pusesse a coordenar meu próprio tribunal.
Nobreza executada.
Luxúria enaltecida.
Ninguém engana a mim.
Especialmente ninguém próximo.
Só outros.
Quase todos,
Incluindo eu mesmo.
Eu mesmo da verdade tão sem rumo.
Eu mesmo tão pirado e louco de prazer.
Tento resistir desde que me desconheço.
Mas onde me perco é quando me encontro,
E adoro me encontrar.
É hipocrisia recém-nascida.
É hipocrisia hospitalar.

22 fevereiro 2010

Palavras

Acredito que palavras, 
Algumas boas palavras, 
Serão sempre
Apenas,
Algumas boas palavras.
Entretanto,
Lê-las será sempre,
Talvez,
Um bom caminho.
Para qualquer lugar.
Possuo um livro dentro de mim, isso é certeza. 
Já que digo, digo então:
Tenho é um milhão.
Nunca quis, nem rimar.
Agora e sempre, é na vontade.
Na minha vontade de esvaziar.
Se algum dia lhe faltarem as palavras, tenha certeza de que elas estiveram por aqui.
Não tenho medo. Como poderia eu ter medo se me falta agora a palavra?
O medo ficou aqui.
Medo.
Monto.
Desmonto.
Todo.
Não há nada de especial. Garanto.
Apenas palavras. 
Como se chacoalhassem todos os livros de uma só vez,
Sinto-as como abelhas em um enxame.
Demoro. Percebo. 
Não.
Sim.
Estou lá.
Nelas.

05 fevereiro 2010

A Casa

Adeus.

Só ouço de longe,
viro as costas para ela.
E muito mais leve do que chegara.
Fujo já muito mais tarde do que deveria,
da minha prisão,
da minha agonia sem prazer. 
Saio do meu próprio eu.
Descarrego todo meu peso em palavras.
Obedeço à minha vivência.
Olho em volta.
Mas choro por tentar.
Tento.
Sinto lágrimas.
É muito forte.
Eu quero.
Mas é preciso.
Não lembro o porquê.
Não lembro onde estou.
Entro na porta e saio.
Organizo minha imaginação.
Não há volta.
A escolha, afinal, foi minha.
Devo entrar.
Perguntam-me se quero entrar.
Como depressões de carne.
Como sensações horríveis te olhando.
São geladas.
Cumprimento-as.
Elas tinham que estar lá.
Não há volta.
Vou-me arrastando.
Dobro-me.
Meus joelhos já não me pertencem.
Mas meus olhos não se desfocam mais.
Quero olhar em volta.
Fria. Porém irresistível.
Ela está lá.
Avisto-a.
Viro a segunda esquerda.
Ando um pouco.
Saio do metrô.
Já era hora.
Vejo a saída.
Cheiro de repressão.
Não de pessoas.
Quase não suporto o cheiro repugnante do ar.
O cheiro toma conta.
Sinto o ar pesado das indignações.
Pego o trem.

Odeio degraus. 
Infinitos e tortos degraus.
Um por um.
Desço-os.
Entro. 
Mas, já quase sem freio,
vejo a estação.
Ando mais que vagarosamente.
Ando me forçando a parar.
Não posso fugir do que sou.
Mas é tarde demais.
Elaboro um plano.
Hoje não.
Saio de casa.

04 fevereiro 2010

Razão

Cinco anos de Engenharia.
E de engenheiro... Só tenho meu Pai.
Triste?
Não.
Triste deve ser viver uma vida mentirosa.
Nunca aprendi a não gostar dos números, 
Apenas fingi por um tempo que aquilo me elevava a algum patamar.
Então de engenheiro passo a ser poeta,
Se é que posso me chamar assim.
Não sei se existe uma prova para tal título (Doutor em poesia?), mas talvez se existisse, 
Muitos nomes famosos por terem mudado sua visão reta sobre o Mundo,
Teriam sido apenas nomes pretensiosos.
Fernando.
Será mesmo que todos que se atreveram por esses lados sabiam o que estavam fazendo?
Eu mesmo comecei me explicando sobre minha formação
(Não que sinta que deva alguma coisa à alguém, a não ser o Mundo, à mim mesmo),
Acabei de comer uma maçã,
E agora questiono a existência de poesias vomitadas como essa.
Adequado. Não é?
Talvez sim, Talvez Não.
Mas assim como vômito após uma noite de orgias alcoólicas,
Esse texto aflora de mim como uma coisa quase normal,
Me trazendo à tona novamente.
Me tirando do fundo de algum lugar.
Acredito que escrevo, e por isso, escrevo.
Difícil é ver razão.
Não me lembro de ter escutado isso.
Isso me torna um criador?
É minha frase. Inédita?
Talvez sim, Talvez não.
Roubo inconscientemente o Mundo em que vivo.
Recrio e faço você pensar.
Afinal,
Qual é a razão da poesia?
Você sabe?
Ou acha que sabe?
A razão está em nós. Mas é realmente difícil vê-la.
Entendê-la então... nem imaginas.
Entendo você.
Não sua razão.
Porque se atreve então a tentar me interpretar?
Tente.
Mas nunca ache que sabe.
Estará errado já no princípio.
Quem acha, não sabe.
Mas eu sei.
Minha razão é você.
Você, bacia.
Meu depósito pessoal.
À você, Obrigado.